terça-feira, 5 de agosto de 2008

Padawan

REMMINGTON 66

O único som que se ouvia era o das batidas frenéticas na Remmington em cima da escrivania, velha e comida pelos cupins, na cadeira um homem de meia idade, terminava seu livro. Acho que o nome dele era L., só "ele" mesmo, "ele e um ponto". Num quarto sujo e com cheiro de tabaco, uma cama quebrada com um colchão de molas e lençóis puídos, uma caixa de papelão no canto cheia de chepas, uma mancha de vinho num pedaço de carpe... Uma mosca servia de jantar para uma aranha em sua teia no canto do quarto, que dá acesso a um banheiro sem porta, com um vaso imundo e uma pia encardida, em baixo da cama um rato, na verdade acho que era um camundongo, roia um pedaço de pão seco caído ali há dias, era apenas um quarto... Um quarto podre, de um hotel podre, de uma cidade podre, de um país podre, de um mundo que é uma privada cheia de merda, quando tudo para... O homem levanta-se acende um cigarro, e enche um copo de conhaque e toma de uma só vez, enche o copo novamente e agora toma acompanhando o ritmo do cigarro, passa os olhos sobre as linhas que acabara de datilografar, abre um sorriso evasivo, enrola os papéis e sai com um passo apressado e firme, deixando a porta escancarada, passa pelo quarto do começo do corredor, numa distração suficiente para não perceber que o casal de gays que mora ali estava transando, desse as escadas de dois em dois degraus, passa pelo saguão sem dizer uma única palavra para os que estavam ali, sai do hotel e anda 50 metros para oeste, quando precisa atravessar a rua mas é interrompido no meio do caminho por cinco rapazes alcoolizados em um carro desgovernado em alta velocidade, que fogem da cena deixando aquele homem de idade acabada, com a cara colada no asfalto e os papéis manchados de sangue e a velha Remmington empoeirando sobre a escrivania do quarto.

"QUANDO VOCÊ DEIXA SUA MÁQUINA DE ESCREVER, VOCÊ DEIXA SUA METRALHADORA, E OS RATOS SURGEM AOS BORBOTÕES"


Padawan 01/03/2007

Um comentário:

Maurélio disse...

Olá Padawan, parabéns pelo belo texto.
Abraços Usbeanos.